
Por: António Mendonça
Bastonário
A 4 de julho último o Ministério da Economia tornava público um Programa de estímulos à economia significativamente designado “Acelerar a Economia”.
Nele se sistematizam 20 desafios que vão da internacionalização à clusterização, passando pela reindustrialização, inovação, escala, ou sustentabilidade, sem esquecer matérias como capitalização, financiamento ou qualificação. Para dar resposta a estes desafios são alinhadas 60 medidas, com diferentes prazos de execução, num horizonte temporal que se projeta para a legislatura em curso.
Sem prejuízo de uma análise mais profunda que um programa desta natureza e no contexto em que se propõe intervir exige, é de louvar, desde já o propósito e a ambição. Mas sente-se a falta de uma avaliação mais profunda da coerência global das medidas e dos impactos sobre a especialização futura da economia.
De facto, a economia portuguesa necessita daquilo que já foi designado por alguns economistas como um choque de crescimento. Mas, mais do que um conjunto de medidas, visando atuar em dimensões cuja importância ninguém contesta, é necessário introduzir uma dimensão estratégica, de médio-longo prazo, que rompa com a cultura instalada de intervencionismo imediatista e de efeito rápido e permita introduzir uma dinâmica coerente de crescimento, sustentada na inovação tecnológica e na produção de maior valor acrescentado.
Uma economia, como a portuguesa, que se vê confrontada com tendências crescentes de emigração das novas gerações mais educadas e qualificadas e de imigração de mão de obra com baixos níveis de qualificação, só pode refletir um desajustamento estrutural que se vem afirmando progressivamente e que ameaça tornar-se numa espécie de “doença de sobrespecialização perversa”, cada vez mais difícil de ser controlada.
O Programa refere ter ouvido os diversos agentes económicos, organizações e individualidades sobre o desenho e a implementação das diferentes medidas, o que, igualmente, é de louvar.
Mas é necessário ir mais além. É necessário, igualmente, dar uma dimensão estrutural e estratégica a este desiderato, com a criação de uma instituição especializada e permanente de produção de estratégia sobre a economia portuguesa, à semelhança do que já existiu no passado e que, por razões que a razão desconhece, foi progressivamente esvaziada até deixar de existir.
Uma estrutura integrada por quadros empenhados e altamente qualificados, sob tutela do Ministério da Economia, que não só contribua para a produção de coerência das diversas políticas económicas prosseguidas por cada governo, como também garanta a consistência temporal das políticas prosseguidas pelos sucessivos governos, evitando os custos desastrosos, para a economia e para o País, da permanente revisão de decisões tomadas ou da tendência endémica para a procrastinação, mesmo quando elas aparentemente são definitivas.
Em suma, é necessário introduzir visão e coerência estratégica de longo prazo.
In Jornal Económico – 19 de julho de 2024
Uma resposta
Quando falamos em desenvolvimento económico, temos de abordar o crescimento económico. Só assim se podem preparar premissas que influenciam os decisores políticos, cuja coragem tem de ser posta à prova. Conto que seja este o objectivo da iniciativa de acelerar o “choque de crescimento económico”.
O que impulsiona o crescimento económico e o crescimento a longo prazo?
Existem três fatores principais que impulsionam o crescimento económico:
– Acumulação de capital social;
– Aumentos de matérias-primas, e.g., mão de obra, como trabalhadores ou horas trabalhadas; e
– Inovação e avanço tecnológico.
Está demonstrado, tanto teórica como empiricamente, que o progresso tecnológico é o principal motor do crescimento a longo prazo. A explicação é bastante simples. Mantendo relativamente flutuantes os outros fatores de produção, a produção adicional obtida (VAB) ao adicionar uma entrada unitária extra de capital ou trabalho acabará por reduzir a sua importância relativa (de acordo, aliás, com a lei dos rendimentos marginais decrescentes).
Como resultado, Portugal não deverá manter o seu crescimento de longo prazo simplesmente acumulando mais capital ou trabalho. Por conseguinte, o motor do crescimento a longo prazo tem de ser o progresso tecnológico. Por outras palavras, isso implica inovação e desenvolvimento tecnológico.
O desenvolvimento de um país depende do seu crescimento económico e os países que promovem elevados níveis de competências na sua população prosperam a longo prazo. Os ganhos no PIB relacionados com a melhoria das competências (skills) conduzem a ganhos substanciais no PIB per capita, que podem ser utilizados para financiar outros objetivos, aliás, como estabelecido nos “Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas”. Não é o crescimento pelo crescimento, turbulento e aleatório, mesmo com a inércia dos poderes públicos a (não) funcionar. A melhoria da qualidade do ensino tem enormes ganhos económicos potenciais. Sem esta premissa estar bem interiorizada nos vários orgãos de soberania, esta iniciativa será mais uma oportunidade extraviada.