Leilão de Slots

Por: Lara Gamas

Membro Efetivo nº 16346

Na semana em que chegamos finalmente a um consenso sobre a localização do novo aeroporto, questiono se esta construção será suficiente para acabar com todos os problemas que enfrentamos.

Nas últimas décadas, têm sido constantes os desafios com que a indústria do transporte aéreo se tem vindo a deparar.

Aliado à introdução das companhias aéreas de baixo custo no mercado, os meios aéreos tornaram-se um dos transportes mais utilizados atualmente, passando a existir uma ampla oferta de companhias aéreas, não acompanhada pelo aumento da capacidade aeroportuária, o que exacerbou as questões relativas à eficiência de afetação dessa capacidade escassa, por forma a solucionar o desequilíbrio entre a oferta e a procura.

Com a sua utilização massiva surgem assim, vários problemas associados, nomeadamente, no que respeita à possibilidade dos aeroportos se adaptarem e aumentarem a sua capacidade, levando a inúmeros casos de congestionamento e atrasos, causando elevados custos tanto para os aeroportos e companhias aéreas, como para os passageiros.

A impossibilidade prática de utilização dos normais mecanismos de mercado para, através dos preços, igualar oferta e procura, num mercado concorrencial spot, tornou necessário que exista um mecanismo alternativo de afetação de capacidade entre os diferentes usos e utilizadores.

A solução tradicionalmente adotada é o processo de atribuição de slots da International Air Transport Association (IATA), que utiliza um método de afetação, através do qual estabelece e atribui horários de descolagem e aterragem com base na utilização histórica. Porém, não só não parece estar a lidar adequadamente com esta escassez de capacidade aeroportuária, como apresenta vários inconvenientes relacionados com a concorrência entre companhias aéreas, pelo que se reveste da maior importância explorar mecanismos alternativos de afetação de capacidade.

Em abstrato, grande parte dos naturais conflitos entre os diversos agentes económicos ligados ao transporte aéreo, bem como a afetação de recursos neste setor, poderia ser resolvido pelos normais mecanismos de mercado, não fora o setor ter especificidades que inevitavelmente limitam esses mecanismos. Desde logo a utilização do bem de domínio público “espaço aéreo” tem características de bem comum e requer intervenção pública e coordenação internacional para voos internacionais, que forçosamente o utilizam, mas também para a coordenação do tráfego aéreo que, por si só, tem características de bem público.

Por outro lado, a instalação de infraestruturas aeroportuárias requer um conjunto tão grande de requisitos em terra e no ar, e impõe tais restrições na gestão territorial e do espaço aéreo, que é incompatível com a livre entrada no mercado, limitando dessa forma a concorrência entre estas infraestruturas.

Diante dessas especificidades, a introdução de regulação económica no setor torna-se necessária para controlar a entrada no mercado e prevenir o abuso de poder de monopólio. A privatização é uma forma de regulação económica, como exemplificado pelo Reino Unido, onde a privatização visa maximizar lucros e restringir o poder de mercado das companhias. Na Alemanha, aeroportos como o de Hamburgo utilizam mecanismos como o price-cap, e o aeroporto de Frankfurt recorre a negociações de longo prazo com as companhias aéreas.

Muitos dos problemas de ineficiência existentes nos aeroportos, resultam de uma má gestão e fraca capacidade de decisão sobre investimentos.

De acordo com as previsões da EUROCONTROL (Organização Europeia para a Segurança da Navegação Aérea), mesmo depois de levar em consideração as melhorias de infraestrutura planeadas atualmente na Europa, continuará a não existir resposta para, pelo menos, 10% da procura até 2030, devido à falta de capacidade aeroportuária. Construir mais pistas e novas infraestruturas aeroportuárias seria a solução óbvia, no entanto, o impacto ambiental e económico é bastante elevado, sem esquecer a morosidade do processo.

Posto isto, sempre que a procura por infraestruturas aeroportuárias, excede a oferta, sucedem-se atrasos, o que implica que haja um racionamento da oferta, geralmente, através de normas administrativas, como a atribuição de slots ou pelo equilíbrio dos preços de mercado.

O regime de atribuição de slots mais básico da União Europeia (UE), e internacional, é o “Grandfather Right”, princípio segundo o qual as companhias aéreas mantêm os slots de que são titulares na temporada seguinte, desde que tenham usado esses mesmos slots em, pelo menos, 80% do tempo – regra “use-it-or-lose-it”. No entanto, a escassez de slots limita a competição, levando a uma atribuição conservadora e dificultando a entrada de novas empresas. Este regime de atribuição aumenta a diferença entre a capacidade aeroportuária e o tráfego, levando a congestionamentos e atrasos e a uma ineficiente atribuição de recursos.

Neste contexto, existem algumas abordagens alternativas, nomeadamente, com recurso a Leilões.

No setor do transporte aéreo, através de um leilão, o slot é atribuído à companhia aérea que maior valor lhe atribui. Com o potencial de introduzir elementos concorrenciais quando não é possível a concorrência no mercado, a utilização de leilões tem sido amplamente utilizada como instrumento de políticas públicas e regulação para a alocação eficiente de recursos escassos, como o espectro radioelétrico, o acesso a centrais de energia, a realização de obras públicas e a atribuição de concessões, além dos leilões utilizados há milénios por iniciativa dos agentes privados.

O leilão para atribuição de slots na aviação promove eficiência e produz benefícios, superando o modelo do “Grandfather Right”. Reduz barreiras à entrada, fortalece a regulamentação, evita perda de lucros, gera receitas e ajuda na expansão dos aeroportos. Os estudos indicam que os seus benefícios superam os custos de implementação. O problema que os leilões enfrentam, está, sobretudo, relacionado com a necessidade de se combinarem slots entre o local de origem e o destino.

Os leilões combinatórios surgem como solução para a alocação eficiente de slots aeroportuários, apesar de ainda não serem amplamente adotados. Em 2015, a China testou leilões para voos domésticos em Guangzhou Baiyun e Shanghai Pudong, distribuindo slots entre sete grandes transportadoras. Embora bem-sucedido, houve críticas sobre os preços praticados, conquanto fossem baseados no valor atribuído por cada companhia aos slots. Este modelo demonstra o potencial dos leilões na aviação para resolver problemas de congestionamento e promover uma distribuição mais equitativa de slots entre as companhias aéreas.

Assim, novos aeroportos são necessários, mas com modelos de gestão eficientes.

 

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