Importância da correção e da clareza dos conceitos, sempre (parte 1)

Por: René Cordeiro

Membro Efetivo nº 56

Tenho escrito sobre a importância da correcção e da clareza dos conceitos no âmbito do tema estratégia empresarial, tema que tem ocupado o essencial da minha ocupação profissional sobretudo nos últimos quarenta anos, quer como executivo, quer como consultor.

A importância atribuída decorre, entre outros factores, de acreditar que a observação do mundo natural nos dá as referências fundamentais da compreensão e da acção humanas em todos os âmbitos em que a nossa espécie actua. Sempre que se pretende alterar esse mundo que todos observamos sem respeitar as suas regras, as consequências são nefastas e as resistências às alterações pretendidas manifestam-se por uma razão que parece clara: aquilo que é, no mundo natural incomum não deve, na acção humana, ser transformado em norma. Então, apenas se exige ao Homem o esforço racional de respeitar a conclusão. Por outro lado, vivendo a actividade empresarial (a organização) de comunicação, a informação que circula deve ter conteúdos correctos e claramente entendíveis para que exista eficácia na acção empresarial.

Frequentemente, vários Clientes envolvidos no nosso processo de melhoria contínua dos processos operacionais, às vezes também no âmbito da formulação da sua estratégia empresarial global, revelavam-nos preocupações pelas dificuldades relativas à correcta compreensão de conceitos estatísticos por parte do pessoal envolvido na aplicação de programas de melhoria de qualidade.

Estes programas implicam processos de controlo estatístico que exigem conhecimentos matemáticos com alguma profundidade sendo aplicados por pessoal operacional que, independentemente de poderem ser enquadrados por quadros com esses conhecimentos, via os seus esforços prejudicados por aquilo que designamos por síndrome da matemática do ensino médio que decorre basicamente do facto de os conceitos de matemática serem, nesse nível, frequentemente tratados de forma algo superficial: os estudantes querem passar, muitas vezes pensando que a matemática não será necessária para o que irão fazer no futuro; e os professores fazem o melhor que podem para assegurarem a sua passagem.

Foi assim que o nosso processo acima referido criou “apoios, bengalas” para ultrapassagem das dificuldades produzidas pela síndrome, dotando aquele pessoal de ferramentas para transporem os dois perigosos obstáculos que se levantam em qualquer programa de melhoria de qualidade: a ilusão do conhecimento – pior do que a ignorância, por se presumir a existência de saber – e a ilusão de incapacidade – que conduz a que, quem não é inepto se julgue sê-lo. Imagine-se a devastação que ocorre na organização quando aqueles com ilusão de conhecimento conduzem os que detêm a ilusão de incapacidade!

Deste modo, o que designamos por “apoios ou bengalas” são apenas guias e pontos de equilíbrio não directamente relacionados com os programas de melhoria de qualidade, criados a partir da nossa experiência com o ensino de adultos em ambiente organizacional e que os nossos clientes utilizam produtivamente quando aplicam aqueles programas, e não só. As explicações seguintes podem parecer a algum leitor tão óbvias que não merecem existir. Mas não se iluda como têm sido de grande importância quando o decisor empresarial afasta o preconceito da ilusão do conhecimento e reconhece a necessidade das mesmas.

É por isto que, neste escrito, abordo o seu título no âmbito organizacional operacional a propósito daquelas preocupações e de como ajudámos os nossos Clientes.

     “Apoio # 1”. Os participantes devem experienciar rápida e convincentemente a utilidade de um conceito: ninguém presta muita atenção a algo que, aparentemente, não seja útil de algum modo. Exemplo: se dizemos a alguém que deve descrever um problema antes de desenvolver as acções para o resolver pode, compreensivelmente, resistir a fazê-lo. Porque qualquer pessoa pode referir problemas que resolveu automaticamente, por instinto, sem necessidade de “complicar a situação”. Todavia, se pedirmos à mesma pessoa que liste o que pergunta a colegas quando surge um problema, invariavelmente as respostas são do tipo “o que aconteceu?”, “quando ocorreu?”, “quão grave é a situação?”. Então, se demonstrarmos que lhes podemos prover uma moldura para os ajudar a fazê-lo metódica e consistentemente, reagirão imediata e positivamente à utilidade expressa.

“Apoio # 2”. Sempre que possível, os conceitos devem estar “operacionalmente” relacionados para que resulte claro que um conceito conduz ao seguinte. Porque desta forma facilita-se a aprendizagem, ajudando a que se estabeleça uma ampla racionalidade de abordagem e se economize tempo. Por exemplo, ao ensinar a utilização do gráfico de Pareto, demonstramos que este não é mais do que uma folha de registo para acompanhar uma situação que, assim, é exposta de forma clara.

     “Apoio # 3”. Há que evitar explicações vazias sobre como fazer: quem está interessado em aprender está atento. Pelo que poderá rapidamente determinar se e quando o “produto” do ensino está a ser entregue. Se, por exemplo, estamos a explicar como se constroem fluxogramas, não nos devemos focalizar no que antecede a construção ou no aspecto que esta terá, mas no que se faz durante a construção. Normalmente, utilizamos um processo de “gravação mental” começando por algo simples como pôr o carro a trabalhar de manhã, e desenvolver a partir daí com os participantes a descrição, no fluxograma, do que se segue. Assim se vai abrindo espaço à produção de contributos para a sua construção.

     “Apoio # 4”. Os participantes devem “redescobrir” por que uma ideia, ou ferramenta, foi originalmente inventada e por que, hoje, teria de ser inventada se não existisse. Por outras palavras, “por que razão foi isto inventado e por que preciso disto agora?”. A racionalidade das ferramentas e das técnicas tem de ser entendida se o seu domínio é necessário. Se explicamos a alguém como fazer algo, deve ser capaz de repetir o que foi explicado. Se lhe mostrarmos como fazer algo, deve ser capaz de o replicar. Mas se explicarmos a alguém a razão de algo, então deve elaborar a sua opinião, passando assim a dominar o processo que lhe permitirá a sua utilização, de acordo com o seu próprio julgamento, em futura tomada de decisão.

Um dos exemplos que damos é a “folha de registo”, demonstrando a sua utilização pelo Homem em tempos pré-históricos para seguir as pistas dos animais para os caçar. Aplicamos o mesmo princípio quando queremos separar situações complexas nos seus componentes simples. Se o “Homem da caverna” não a tivesse inventado, teríamos certamente de o fazer hoje para proceder aos registos necessários.

(texto a terminar em Junho de 2024)

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