A política externa portuguesa

Por: Mário de Jesus

Membro Conselheiro nº 3122

A política externa é a atividade do Estado “virada para fora” e que trata dos problemas além fronteiras. Esta é influenciada pelas ideologias, motivações e valores dos Estados e dos homens que os lideram. A sua formulação tem em conta motivações de natureza política, económica, cultural e social, para além da afirmação do país na cena internacional. Por vezes, tem um campo de ação limitado e foge ao controlo do próprio país dados os desequilíbrios de natureza económica e política entre as nações e as constantes e rápidas transformações no quadro das relações internacionais.

A política externa portuguesa desenvolve-se em três vetores (históricos, geográficos e políticos) que determinam a ação externa do Estado: A Europa, o Atlântico e a CPLP. Portugal é um país europeu, atlântico e virado para África, já que, não estando no centro nevrálgico europeu, tem a sua centralidade no atlântico, é porta e eixo da União Europeia(UE) para o atlântico norte (EUA), para o atlântico sul (Brasil) e para a África Lusófona. Daqui resulta que a política externa portuguesa tenha que seguir uma estratégia de continuidade com a sua história e não uma rotura com o seu passado e a sua visão euro-atlântica.

Portugal é na Europa um país periférico de média dimensão, porém, com a sua zona económica exclusiva, é a terceira maior nação europeia em dimensão territorial. Com uma fronteira estável ao longo de vários séculos, a importância da política externa é reforçada por esta periferia pois a capital marroquina, Rabat, é  mais próxima do que qualquer outra capital europeia. É através dela que nos aproximamos do “centro europeu”.

Membro de pleno direito desde 1986, Portugal esteve sempre comprometido e empenhado na construção do projeto europeu em todas as suas vertentes. Assinamos todos os tratados que conduzam e garantam a paz, prosperidade, igualdade e a defesa dos princípios e valores do modelo europeu nos quais acreditamos. Aqui, a política externa tem que participar e responder a desafios como o próprio alargamento da UE, a crise migratória, o renascimento de populismos extremados, o fenómeno do terrorismo, o modelo de defesa europeu ou as crises financeiras e económicas que agridam a Europa.

Na vertente atlântica, a posição geográfica exige uma política externa que dê resposta aos imperativos de segurança estratégica e geográfica que o oceano encerra. Torna-se especialmente importante a relação com a aliança Atlântica e com países como os EUA e o Reino Unido. A ligação à NATO no contexto atual da guerra na Ucrânia e do conflito israelo-palestiniano, traz particular importância a uma defesa europeia conjunta, articulada e global. A localização geográfica neste eixo atlântico é também relevante para o comércio internacional. Aqui, a política externa tem que estar centrada no papel de Portugal no comércio internacional dada a sua centralidade atlântica, distinta dos restantes países europeus. Esta, posiciona-nos entre o atlântico norte e sul, entre o mediterrâneo e o atlântico, colocando uma especial responsabilidade na relação política, geoestratégica, económica e comercial com a Europa do norte,  os EUA, o Brasil e a África Lusófona.

Na relação com a CPLP, o vetor central é a língua portuguesa. As estimativas apontam para que em 2050 existam cerca de 400 milhões de falantes da língua e cerca de 500 milhões em 2100. Atualmente, estima-se que existam cerca de 260 milhões de pessoas a falar português, sendo a língua oficial em nove países, a quarta mais falada do mundo e  presente em quatro continentes: na América, África, Ásia e Europa. O espaço da CPLP é um espaço unido pela língua, de grande identidade histórica e cultural, com diferentes graus de desenvolvimento e potencial económico e comercial ainda por explorar. Como organização recente, há muito a fazer para uma estreita colaboração política, cultural, comercial e económica já que encontramos países que evoluem a “diferentes velocidades”. Havendo um grupo de países observadores da dinâmica da CPLP, Portugal pode ter um papel de interlocutor e agregador, desde a esfera política à cultural, na afirmação e relação da CPLP com parceiros de fora. Através desta, Portugal pode projetar a sua cultura e história no quadro internacional através de ações concertadas com os restantes parceiros para uma dinâmica de desenvolvimento e afirmação internacional.

Portugal é um país aberto ao exterior com um crescente grau de internacionalização. Na vertente económica e empresarial, por exemplo, o peso das exportações no PIB passou de 26,6% em 1996 para 47,5% em 2023. Nas vertentes cultural e científica, vemos a intensificação das relações externas. Não devendo haver interferência do Estado no setor empresarial, cultural ou científico, é imprescindível existir um ambiente favorável e políticas públicas facilitadoras do progresso nestas áreas. Também aqui o papel da política externa é determinante no estabelecimento de acordos, ações de cooperação e relações institucionais, que, a longo prazo, facilitem o progresso, o desenvolvimento, a prosperidade e o crescimento destas áreas da economia, da cultura e do saber.

A política externa assume um papel determinante na internacionalização, na economia e na afirmação de Portugal no mundo. Ela não deve estar ao sabor de interesses político-partidários, caprichos, preferências de alguns ou agendas de outros, pois ela corresponde aos interesses permanentes, atuais e futuros, da nação. Tem que incorporar uma visão de Estado/Nação, assumir a responsabilidade pela diplomacia económica, científica, cultural e política em nome do país. Ela é apartidária e as suas decisões devem ser multipartidárias, servindo todos e servindo o país. “My country right or wrong” como afirmou Winston Churchill.

O seu papel é importante não só pela firmação nacional mas sobretudo pela necessidade de enfrentar os desafios que o mundo coloca no plano internacional. Na sua agenda estão temas como o desenvolvimento sustentado e a questão ambiental; a defesa dos direitos do homem e das minorias; o problema das migrações e dos refugiados; a igualdade do género; o combate ao tráfico de drogas e de armas; o terrorismo; a defesa dos oceanos e a participação nos processos de paz. Estes são também os grandes desígnios nacionais.

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