Turismo: riscos e estratégias

Por: Jorge Fonseca de Almeida

Membro Conselheiro nº 1083

Um estudo do Comité Europeu das Regiões intitulado “O Futuro da Indústria na Europa” mostrava que as regiões europeias com elevados rendimentos se especializam em indústrias de alta tecnologia enquanto as regiões em que os rendimentos dos cidadãos são baixos se especializam em indústrias de baixas tecnologias orientadas para exportação. Portugal tendo hoje como principal indústria o Turismo encontra-se, evidentemente, entre as regiões com os rendimentos mais baixos.

O turismo, gerando receitas pelas estadias, pela restauração, pela frequência de locais históricos ou pela visita a paisagens naturais, praias, zonas rurais, áreas citadinas mais típicas, é uma indústria de baixa tecnologia, em que os empregos são mal remunerados, o valor acrescentado baixo e praticamente dependente das exportações (turistas estrangeiros).

Acresce que muitas das receitas desta indústria são apropriadas por empresas ou países terceiros, isto é não beneficiam a nossa economia, embora tenham sido geradas à nossa custa e custo. De facto desde logo os turistas chegam-nos através de agências de viagem e em companhias aéreas estrangeiras cujos bilhetes são pagos no país de origem do viajante. Pernoitam em grandes números em hotéis pertencentes a cadeias internacionais e aí fazem muitas das suas refeições. Estas empresas hoteleiras logicamente expatriam os lucros obtidos. Mas estes turistas cujas principais receitas não vemos provocam inúmeros custos de manutenção nos locais que visitam, originam gravosos custos ambientais, muitas vezes irreversíveis, exigem um investimento nacional em infraestruturas, e em locais de entretenimento e requerem campanhas publicitárias pagas pelo erário público nos países de onde vêm.

Não é por acaso que nenhum dos países da zona Euro mais dependentes do turismo – Croácia, Chipre, Malta, Portugal, Espanha e Grécia – se encontra entre os mais ricos da União Europeia e dois encontram-se mesmo entre os cinco com um PIB per capita mais baixo.

É possível uma ainda maior especialização no Turismo em Portugal, onde já representa cerca de 15% do PIB? Sim, claro. Existem vários casos no mundo e na Europa. A Croácia é um bom exemplo. O turismo representa mais de 25% do seu PIB e é um dos países mais pobres da União (fonte: https://www.statista.com/statistics/1228395/travel-and-tourism-share-of-gdp-in-the-eu-by-country/). Fora da Europa temos exemplos como o da Jamaica e o das Maldivas, em que o Turismo representa em torno de 30% do PIB, mas em que também não proporciona um elevado nível de vida a esses países. A regra parece ser que quanto maior a fatia do PIB gerada pelo Turismo mais pobre o país.

O grosso do emprego criado pelo turismo é em postos de trabalho precários, sazonais, auferindo salários baixos, exigindo uma escolaridade baixa ou média-baixa. Este emprego tem vindo a ser ocupado por imigrantes com baixas qualificações (veja-se o caso da restauração). Claramente não é o Turismo que contribuirá para a retenção de jovens com maiores qualificações.

A especialização no Turismo cria, por outro lado, uma enorme dependência da situação geopolítica na Europa e no mundo. O Turismo exige Paz e boas relações entre os povos. Todos nos recordamos dos fortes danos ao turismo dos países mediterrânicos-africanos, como a Tunísia e Marrocos, causados pelo terrorismo ou, mais recentemente, da queda abrupta do PIB português devido a epidemia de COVID-19 que paralisou o setor. Num momento de grande instabilidade internacional, em que se desenrola na Europa uma guerra em que a NATO está empenhada, e que pode alastrar por todo o continente, em que o Médio Oriente está a ferro-e-fogo, em que vários países-chave da União Europeia estão a entrar ou já se encontram em recessão, a aposta no Turismo é sem dúvida uma aposta muito arriscada como se viu em 2020.

Esta é uma aposta que fragiliza a nossa Pátria, que lhe cria uma enorme vulnerabilidade estratégica, que pode ser explorada por terceiros, que nos empurra para o clube dos mais pobres, que exige uma enorme massa de trabalhadores não-qualificados, que nos coloca nas mãos dos países emissores de visitantes (quem não se lembra dos estragos causados pela simples inclusão de Portugal na lista vermelha de viagens do Reino Unido durante o Covid – com essa ou outra lista os países conseguem redirecionar os seus turistas para os destinos que pretendam).

É, pois, tempo de parar e pensar. De delinear uma estratégia para o setor que permita o crescimento das receitas retidas no país, que crie postos de trabalho qualificados, mas que contenha o peso do Turismo na nossa economia e no mercado de trabalho e nos liberte de dependências externas constrangedoras.

Uma resposta

  1. Subscrevo na íntegra, há muito que não lia uma análise tão bem elaborada ,explicada , intuitiva e de grande poder de análise.
    OBRIGADO

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