Por: Ana Brasão (e Cátia Sousa)
Membro Conselheiro nº 16442
A Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável: Transformar o nosso Mundo, aprovada unanimemente pelos Estados Membros das Nações Unidas em 2015, visa erradicar a pobreza, proteger o ambiente e promover a prosperidade até 2030. Com base em cinco princípios (Pessoas, Planeta, Prosperidade, Paz e Parcerias), inclui 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs), 169 metas e 232 indicadores de desempenho, e abrange as dimensões económica, social e ambiental (Figura 1.1).
Figura 1.1. Relação entre os 5P e os ODSs. Fonte: Buła et al. (2024).
A concretização da Agenda 2030 requer uma resposta multissetorial, sendo os ODSs adaptáveis a diferentes realidades.
2 – ODSs no setor dos transportes marítimos
O transporte marítimo movimenta mercadorias, cargas e pessoas por rios, mares e oceanos, desempenhando um papel crucial na economia global. Em 2021, gerou um valor acrescentado bruto de mais de 44 mil milhões de euros, com um volume de negócios de 176 mil milhões de euros e empregou diretamente quase 380.000 pessoas. Contudo, é um dos maiores emissores de gases de efeito estufa, prejudicando a atmosfera, água e biodiversidade. Até 2019, as emissões do setor cresceram 34% em comparação com 1990, devido à frota envelhecida e à supremacia dos combustíveis fósseis.
Os portos, pontos de partida e de destino do transporte marítimo, são infraestruturas estratégicas, variando em tamanho e importância. Três cadeias de valor estão associadas ao setor: combustível marítimo, construção naval e operações (Figura 2.1).
Figura 2.1: As 3 cadeias de valor marítimas. (Fonte: Linde t al., 2023)
2. 1 Implementação dos ODSs
Ao analisar este setor de atividade, facilmente se concluí que podemos desenvolver uma gestão que inclua e tenha em conta os 17 ODSs:
| 1 – Erradicar a pobreza
Oportunidades de emprego na construção naval, operação portuária, operação dos navios e logística. Promoção do crescimento económico e surgimento de novas oportunidades de trabalho através da facilitação do comércio global Promoção de emprego nas diversas atividades da cadeia de valor das energias renováveis (e.g. construção, operação e manutenção de centrais renováveis). |
| 2 – Erradicar a fome
Distribuição global de alimentos devidamente acondicionados, contribuindo para a segurança alimentar. Dinamização do setor agrícola e das economias rurais ao garantir o transporte de produtos agrícolas. |
| 3 – Saúde de qualidade
Normas rigorosas de saúde e segurança para trabalhadores do setor. Transporte de medicamentos e equipamentos médicos |
| 4 – Educação de qualidade
Programas de treino e qualificação para melhorar e estender as competências dos trabalhadores do setor. Iniciativas educacionais, nas comunidades locais. |
| 5 – Igualdade de género
Promoção da igualdade de género através de políticas que incentivem a contratação de mulheres. Garantia de igual acesso a oportunidades de promoção da carreira. Renumeração igual para homens e mulheres nas mesmas funções. |
| 6 – Água potável e saneamento
Tecnologias para evitar derrames e descarga de resíduos no mar, reduzindo a poluição da água Boas práticas de gestão da água a bordo e nos portos. Equipamentos mais eficientes, que evitem o desperdício de água |
| 7 – Energias renováveis e acessíveis
Utilização de energias renováveis nas operações portuárias. Eficiência Energética Eletrificação dos navios e carregamento com eletricidade verde |
| 8 – Trabalho digno e crescimento económico
Manual de boas práticas que salvaguarde normas laborais justas e condições de trabalho seguras. Promoção do crescimento económico por duas vias: 1) Mobilidade de pessoas e mercadorias entre regiões e 2) Criação oportunidades de emprego, incluindo políticas específicas para jovens e pessoas com deficiência |
| 9 – Indústria, inovação e infraestruturas
Investimento na modernização e desenvolvimento de infraestruturas portuárias sustentáveis, tais como infraestruturas renováveis e de carregamento elétrico dos navios. |
| 10 – Reduzir as desigualdades
Distribuição equitativa dos benefícios do setor. Adoção de boas práticas que respeitem os direitos humanos e promovam a justiça social. |
| 11 – Cidades e comunidades sustentáveis
Integração Empresas-Comunidade visando a melhoraria da qualidade de vida dos habitantes através da redução dos impactos ambientais e da utilização de energias renováveis e promoção da eletricidade verde. |
| 12 – Produção e consumo sustentáveis
Boas práticas de economia circular Gestão de Resíduos: Implementar práticas eficazes de gestão e reciclagem de resíduos nos navios e portos. Redução de resíduos: Promover práticas sustentáveis ao longo de toda a cadeia de abastecimento marítima através da adoção de tecnologias mais eficientes, e da implementação de boas práticas de reciclagem e de reutilização de materiais dos navios em fim de vida |
| 13 – Ação climática
Mitigação de emissões através da descarbonização do setor: eletrificação dos navios, gestão sustentável ao longo da cadeia de abastecimento, energias renováveis, eficiência energética Estratégias de adaptação às mudanças climáticas e eventos meteorológicos severos: proteção das infraestruturas e navios existentes, e adoção de infraestruturas e navios mais resilientes |
| 14 – Proteger a vida marítima
Proteção dos Oceanos: evitar derrames e descarga de resíduos para o mar, redução da poluição sonora causada pelos navios Conservação Marinha: Apoiar iniciativas locais de conservação e recuperação de ecossistemas marinhos. |
| 15 – Proteger a vida terrestre
Adoção medidas rigorosas para prevenir derramamentos de óleo e substâncias nocivas decorrentes das atividades do setor Políticas que respondam de imediato a situações de derramamentos de óleos e substâncias nocivas. Utilização dos recursos naturais de forma sustentável, evitando a degradação ambiental. |
| 16 – Paz, justiça e instituições eficazes
Promoção da transparência e da responsabilidade nas operações marítimas e portuárias. Combate à Corrupção.
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| 17 – Parcerias para a implementação dos objetivos
Difusão da inovação tecnológica, boas práticas para uma gestão mais sustentável do setor marítimo. Parcerias com instituições de Ensino Superior e centros de investigação. |
3. Desafios
Implementar os ODSs no setor marítimo comporta vantagens como melhoria da reputação corporativa, a redução de custos operacionais, o acesso a financiamento e a novas fontes de receita, a conformidade regulatória e a atração e retenção de talentos qualificados. Todavia, enfrenta barreiras significativas: falta de conscientização entre os decisores, altos investimentos iniciais, limitações das infraestruturas, disponibilidade limitada de dados e métricas confiáveis, e a complexidade de novas práticas sustentáveis. A necessidade de parcerias estratégicas, a cultura organizacional e o enquadramento legal também influenciam a implementação.
A ausência de dados credíveis sobre os custos para alcançar os ODSs, o que dificulta o planeamento, a afetação de recursos e o apoio financeiro internacional contrapõe-se à urgência de agir agora para evitar custos mais elevados no futuro. Cada ano que passa sem financiamento adequado aumenta os gastos necessários até 2030 e limita a probabilidade de realização dos ODSs (UNCTAD, 2024).
É, portanto, fundamental o comprometimento dos stakeholders privados e públicos no sentido de transformar as barreiras identificadas em oportunidades e, assim, concretizar a Agenda 2030.
