
Por: António Mendonça
Bastonário
Não existe um caminho claro para financiar os investimentos necessários na Europa. Pior do que tudo, generaliza-se o sentimento entre empresas e cidadãos de que os governos não tenham compreendido ainda a gravidade do momento.
O lema dos Jogos Olímpicos, acrescido desde 2021 da palavra Communiter – Juntos –, para simbolizar a importância da solidariedade global e do trabalho colaborativo em tempos de crise, sintetiza na perfeição os desafios que a Europa tem pela frente se quiser ultrapassar a crise estrutural profunda em que está mergulhada, praticamente desde a a crise económica e financeira de 2008-2009. Uma crise não apenas económica, mas de identidade coletiva e de projeto que se aprofundou com a Covid e todos os acontecimentos que se lhe seguiram, adquirindo características geoeconómicas e geopolíticas que a eleição de Donald Trump só veio dramatizar.
Na recente conferência “Um ano após o relatório Draghi: o que foi alcançado, o que mudou”, realizada em 17 de setembro, Mario Draghi, reconhecendo o esforço da Comissão Europeia para responder aos desafios levantados no seu relatório, não deixou de sublinhar que, no ano entretanto decorrido, as pressões sobre o modelo de crescimento aumentaram e que sem a aceleração do crescimento, a Europa não será capaz de concretizar as suas ambições, em matéria de clima, de digitalização e segurança, já para não falar do financiamento necessário às suas sociedades em envelhecimento.
Draghi referiu, em particular, que as necessidades de financiamento anual para responder aos desafios do relatório, antes estimadas em 800 mil milhões de euros para 2025-2031, passaram para 1200 mil milhões, de acordo com cálculos do BCE, enquanto a parte pública quase duplicou, passando de 24% para 43% – um extra de 510 mil milhões/ano, resultante do financiamento eminentemente público da defesa. Isto, num contexto de espaço fiscal reduzido, com a dívida pública a crescer 10 pontos percentuais na próxima década, atingindo os 93% do PIB europeu, numa perspetiva mais otimista de crescimento do que a realidade atual.
E não se fica por aqui a sua análise. Um ano depois, a Europa encontra-se numa situação mais complexa. O modelo de crescimento está a enfraquecer. As vulnerabilidades estão a aumentar. E não existe um caminho claro para financiar os investimentos necessários. Mas, pior do que tudo, generaliza-se o sentimento entre empresas e cidadãos de que os governos não tenham compreendido ainda a gravidade do momento.
Esta análise de Draghi, é desenvolvida numa perspetiva de cenários de evolução a médio prazo (horizonte 2030-2035), num recente estudo realizado no âmbito do Instituto Bruegel, para a reunião informal dos ministros das finanças e dos governadores dos bancos centrais da UE, que teve lugar em Copenhaga, a 19/20 de setembro. As conclusões reforçam a análise do relatório Draghi do ano anterior. Se a Europa quiser deixar de ser um scenario-taker para se afirmar como um scenario-maker, terá de ganhar autonomia estratégica em áreas chave, como a defesa, tecnologia, finanças e matérias-primas críticas – áreas em que se deixou ficar para trás.
Retomando o título deste artigo, agora nas próprias palavras de Draghi expressas na sua intervenção, um novo caminho para a Europa necessita de mais velocidade, escala e intensidade. E, acrescentamos nós, necessita do reforço do trabalho conjunto e solidário através do aprofundamento da integração.
In Jornal Económico – 26 de setembro de 2025